Crise familiar: prevalece cada vez mais o “eu” sobre o “nós”
Hoje “os laços conjugais e familiares são de muitos modos colocados à prova”: o Papa parte de uma reflexão sobre a cultura atual “que exalta o individualismo narcisista, uma concepção da liberdade desligada da responsabilidade pelo outro, o crescimento da indiferença para com o bem comum, o impor-se de ideologias que agridem diretamente o projeto familiar, como também o crescimento da pobreza que ameaça o futuro de tantas famílias”.
“Depois, há as questões abertas pelo desenvolvimento de novas tecnologias - sublinha -, que tornam possíveis práticas, por vezes, em conflito com a verdadeira dignidade da vida humana”. Prevalece cada vez mais o “eu” sobre o “nós”, o indivíduo sobre a sociedade: “É um êxito que contradiz o plano de Deus, que confiou o mundo e a história à aliança do homem e da mulher”.
Ideologia de gênero: desconcertante
Sem mencionar diretamente a ideologia de gênero, o Papa fala da necessidade de “reconhecer a diferença como uma riqueza e uma promessa, não como um motivo de sujeição e de prevaricação. O reconhecimento da dignidade do homem e da mulher leva a uma correta valorização de seu relacionamento recíproco. Como podemos conhecer profundamente a humanidade concreta da qual somos feitos sem aprendê-la através desta diferença?”:
“É impossível negar a contribuição da cultura moderna à redescoberta da dignidade da diferença sexual. Por isso, é muito desconcertante constatar que agora esta cultura apareça como bloqueada por uma tendência a cancelar a diferença, em vez de resolver os problemas que a mortificam”.
Na verdade - continuou o Papa -, “quando as coisas estão indo bem entre homem e mulher, também o mundo e a história vão bem. Caso contrário, o mundo se torna inóspito e a história pára”.
Beleza do casamento e misericórdia para as famílias feridas
O testemunho da “beleza da experiência cristã da família” - destaca Francisco -, deverá inspirar-nos ainda mais profundamente; ao mesmo tempo, é necessário ter “grande compaixão e misericórdia pela vulnerabilidade e falibilidade do amor entre os seres humanos”, mas sem resignar-se à falência humana, para apoiar o resgate do plano de Deus para a família, “ícone da aliança de Deus com toda a família humana”:
De fato, é correto reconhecer que, às vezes, “apresentamos um ideal teológico do matrimônio demasiado abstrato, construído quase artificialmente, distante da situação concreta e das possibilidades efetivas das famílias tais como são. Esta excessiva idealização, sobretudo quando não despertamos a confiança na graça, não fez com que o matrimônio fosse mais desejável e atraente; muito pelo contrário”.
Proximidade da Igreja
Os dois Sínodos sobre a família – observou ainda o Papa –, “manifestaram a necessidade de ampliar a compreensão e o cuidado da Igreja por este mistério do amor humano no qual o amor de Deus por todos se sedimenta”. Neste sentido, “o tema pastoral de hoje não é apenas o da distância de muitos do ideal e da prática da verdade cristã do matrimônio e da família; mais decisivo ainda se torna o tema da ‘proximidade’ da Igreja”:
“Proximidade às novas gerações de cônjuges, para que a bênção de seu relacionamento os convença sempre mais e os acompanhe, e proximidade às situações de fraqueza humana, para que a graça possa resgatá-los, reanimá-los e curá-los. O indissolúvel vínculo da Igreja com seus filhos é o sinal fiel mais transparente do amor fiel e misericordioso de Deus”.
Teologia e pastoral caminham juntos
O Papa Francisco recorda, por fim, que “a teologia e pastoral caminham juntos”: “Não nos esqueçamos de que também os bons teólogos, como os bons pastores, têm o cheiro do povo e das estradas e, com sua reflexão, derramam óleo e vinho nas feridas dos homens”:
Uma doutrina teológica que não se deixa orientar e plasmar pela finalidade evangelizadora e pelo cuidado pastoral da Igreja é também impensável para uma pastoral da Igreja que não saiba fazer tesouro da revelação e da sua tradição, voltada a uma melhor inteligência e transmissão da fé”. (SP)
Fonte: Radio Vaticano
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