Arquidiocese de São Paulo | Maio 22, 2020
Dom Carlos Lema Garcia, bispo-auxiliar de São Paulo: “Podemos tirar um grande benefício deste confinamento para aumentar a nossa proximidade de Deus”
Dom Carlos Lema Garcia, bispo-auxiliar de São Paulo e Vigário Episcopal do Vicariato Episcopal para a Educação e a Universidade, publicou no site do jornal O São Paulo, da sua Arquidiocese, a seguinte reflexão sobre o impacto do silêncio em nossa vida de oração:
Vivemos determinadas condições atualmente que, esperamos, nunca mais se repitam em nossas vidas. Em razão do isolamento social como prevenção do contágio pelo coronavírus, estamos passando diariamente por um período de maior silêncio. Silêncio nas ruas pela diminuição do trânsito, do barulho causado pelas pessoas reunidas nos bares, restaurantes, conversando nas calçadas etc. Queiramos ou não, mesmo que estejamos com nossas famílias e tenhamos nosso trabalho e atividades normais, dentro das nossas casas também temos muitos momentos de silêncio. E o silêncio não é um vazio, mas tem grande importância para o cultivo da vida interior.
É bem atual o que o Cardeal Robert Sarah escreveu em seu livro intitulado “A Força do Silêncio”: “O repouso interior e a harmonia só podem resultar do silêncio. Sem ele, não existe vida… As verdadeiras questões da vida colocam-se no silêncio. O nosso sangue corre nas veias sem fazer barulho, e só conseguimos escutar os batimentos do nosso coração no silêncio”.
Podemos tirar um grande benefício deste confinamento e deste silêncio para aumentar a nossa proximidade de Deus. É conhecida uma passagem da Escritura em que o profeta Elias está cansado e assustado: a rainha pagã Jezabel se utiliza de todos os seus poderes para perseguir o profeta até a morte. Ele esteve andando pelo deserto durante 40 dias. Está exausto. Desanimado. “Ao chegar ao Horeb, o monte de Deus, o profeta Elias entrou numa gruta, onde passou a noite. E eis que a Palavra do Senhor lhe foi dirigida nestes termos: ‘Sai e permanece sobre o monte diante do Senhor, porque o Senhor vai passar’. Antes do Senhor, porém, veio um vento impetuoso e forte, que fendia as montanhas e quebrava os rochedos. Mas o Senhor não estava no vento… Depois do vento, houve um terremoto. Mas o Senhor não estava no terremoto… Passado o terremoto, veio um fogo. Mas o Senhor não estava no fogo. E depois do fogo, se ouviu um murmúrio de uma leve brisa” (1Rs 19, 9a.11-16).
Esta cena se repete agora em nossas vidas. É como se Deus nos perguntasse: “O que acontece com essa correria e esse tumulto na tua vida?” Ou como se Deus nos dissesse: “Sai um pouco desta agitação, para por um momento com essa correria e entra num lugar separado, cultiva uns instantes de solidão acompanhada porque Eu vou passar bem perto”. É interessante reparar que Deus entra em contato com Elias por meio do murmúrio de uma brisa suave: Deus fala na calma do silêncio. Deus não nos força. Seu influxo é suave, porque Deus respeita a nossa liberdade. Devemos ser sensíveis às palavras e aos requerimentos de Deus para a nossa vida.
Muitas pessoas estão reconhecendo que, desde o início da quarentena, estão sentindo a necessidade de rezar muito mais do que antes. Encontram tempo para ler a Bíblia, para fazer um momento de reflexão, de meditação sobre o sentido das suas vidas, para reavaliar os seus valores e para conviver mais intensamente com a própria família. Outros, com razão, sentem uma enorme falta de participar da Santa Missa, de receber a Comunhão e se confessar…
Aquela presença de Deus na brisa suave foi suficiente para que Elias recuperasse o ânimo e continuasse sua missão. Nós também temos o desejo de recomeçar a nossa atividade normal, mas com a experiência de haver aprendido a estar mais tempo com Deus, a melhorar a qualidade da nossa vida de oração.
Por isso, permanecem plenamente atuais as recomendações de Jesus de que devemos rezar em silêncio: “Quando orares, entra no teu quarto, fecha a porta e ora ao teu Pai em segredo; e teu Pai, que vê o que se passa em segredo, te recompensará” (Mt 6,6). É o silêncio do coração que se abre a Deus numa conversa sincera e direta, de quem se sabe na presença de Deus e se retira a um local silencioso para lhe contar as suas coisas. Vamos fazer essa experiência diariamente: aproveitar um momento de silêncio e colocar-nos diante de Deus. Ele quer conversar conosco e nos pergunta sobre o que nos preocupa, quais são os nossos temores, as nossas necessidades, as nossas tristezas e alegrias. O diálogo da oração prossegue ao contarmos para Deus as nossas coisas e, o que é mais importante, quando percebemos que Deus nos responde. Se a oração é uma conversa, as duas partes devem falar e ouvir. É muito consolador perceber que Deus nos responde de verdade: pode ser por uma inspiração que nos vem à cabeça, ou um texto da Bíblia, ou um acontecimento, ou um conselho de alguém etc.
Um dos benefícios que tiraremos dessa quarentena será manter esses momentos de silêncio que nos ajudam a crescer na amizade com Deus, a ter um diálogo de oração e, assim, começaremos a conhecer e amar a vontade de Deus acerca das nossas vidas, a decidir-nos a ser cristãos coerentes, mais generosos e atenciosos com as pessoas. Seremos pessoas mais ponderadas e decididas se aproveitarmos o silêncio para manter a alma aberta ao diálogo com Deus.
Fonte: Aleteia
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