O ano litúrgico encerra com a festa do Cristo Rei do Universo, sendo Ele também o nosso Rei. Jesus foi o Rei dos reis, porque ele deu a sua vida pela salvação de toda a humanidade, e pela sua ressurreição ele nos levou até a eternidade.
Dom Vital Corbellini, Bispo de Marabá – PA
O seu reinado teve como trono, a cruz, como prova máxima do amor de Deus para a humanidade. Toda a liturgia celebra o mistério pascal de Cristo, de sua paixão, morte e ressurreição. Vivenciamos esta festa importante na vida da Igreja, de nosso seguimento a Jesus Cristo, de discípulos, discípulas, missionários, missionárias no mundo de hoje.
Neste domingo comemoramos também o dia nacional dos leigos e das leigas, pessoas batizadas que vivem os seus compromissos na família, na comunidade e na sociedade. O Conselho Nacional do Laicato do Brasil (CNLB) propôs como tema: “Testemunhas de Jesus Libertador no compromisso com a vida” e quer levar a todos fieis, para serem testemunhas do Senhor Jesus visando sempre o compromisso com a vida, o dom de Deus. Os leigos e as Leigas estão presentes nas comunidades, nas pastorais, nos movimentos, nos serviços e também no mundo, vivendo o amor do Senhor, neste tempo de polarizações e de muitas esperanças por um mundo mais humano e mais fraterno. O Concílio Vaticano II afirmou a vocação universal à santidade, para todo o povo de Deus, que advém de Cristo, fonte de toda santidade. Se nem todos são chamados a assumirem os mesmos caminhos, ministérios e trabalhos, no entanto, todos são chamados à santidade (cfr. LG n.32, 39-40)[1]. É importante ver como esta missão foi vivida na Igreja antiga, pelos primeiros escritores cristãos, a importância dos leigos e das leigas que atuaram em suas comunidades pela vivencia da fé, da esperança e da caridade.
A definição do ser leigo e ser leiga
O termo leigo vem do grego laikus, cujo significado é povo[2]. É aquele que recebe o batismo, segue a Cristo e não pertence ao ministério ordenado[3]. A realidade dos leigos e das leigas já estava presente no povo da antiga aliança, quando o Senhor pediu ao povo no deserto de ouvir a sua voz, guardar a sua aliança, para assim ser sua propriedade peculiar entre todos os povos e também para pertencer ao Senhor, um reino de sacerdotes e uma nação santa (cfr. Ex 19, 5-6). Já no Novo Testamento leigo, constitui um dinamismo de participação e de comunhão. Cristo se faz próximo das pessoas, de modo que todos constituem um povo de sacerdotes, de profetas e de reis(cfr. Ap 1,6). Pelo batismo os leigos e as leigas participam do sacerdócio, da profecia e do pastoreio de Cristo Jesus na qual assumem uma missão na família, na comunidade e na sociedade(cfr. Mt 28,19-20). Há o ministério ordenado e o ministério dos leigos e das leigas, a serviço da Igreja e do mundo.
Os deveres das virtudes
As Constituições Apostólicas, escrito do século IV colocou a valorização das virtudes para os leigos e para as leigas, que devem ser postos a serviço da comunidade cristã. O fiel coloca o seu carisma em vista de um fim útil, que é a salvação de todas as pessoas. As pessoas que receberam carismas tenham o uso discreto para assim não se considerarem superiores aquelas nas quais não os receberam. São diversos os carismas que o Senhor Deus concede às pessoas de modo que um recebe um dom e o outro recebe outro dom, e, Deus é glorificado pelos dons dados. Toda a missão depende de Deus porque ele é quem concede os carismas[4].
A necessidade da unidade
São Clemente Romano, bispo de Roma, no final do século I afirmou a necessidade da unidade entre o clero e os fiéis na comunidade de Coríntios. O fato ocorrido de uma forma inconveniente foi uma revolta da comunidade em relação aos seus pastores, bispos, presbíteros e diáconos, de modo que o Papa Clemente pediu a unidade para que em tudo se fizesse a vontade Deus. Ele levantava a questão da superação das brigas, dos ódios, das disputas, das divisões e das guerras entre eles. Existe um só Deus, um só Cristo e um só Espírito de graça e uma só vocação em Cristo[5]. Como os apóstolos vem de Cristo e Cristo vem de Deus, São Clemente exortava a unidade entre os pastores e o povo de Deus porque isto manifestava o amor e a vontade Deus[6].
Leigos e Leigas a serviço da Igreja do Senhor e do mundo
São Justino, Padre da Igreja de Roma, do II século tinha presentes os leigos e as leigas que serviam a Igreja de Cristo e estavam no mundo testemunhando o amor do Senhor. Ele também falava do processo do catecumenato, dos sacramentos da iniciação à vida cristã, na qual exortava aos leigos e às leigas dizendo que após conduzir as pessoas a um lugar onde havia água e com o mesmo banho em que ele tinha sido regenerado, eles também seriam regenerados ao tomar na água o banho em nome de Deus, o Pai soberano do universo, e do Salvador Jesus Cristo e do Espírito Santo[7].
Segundo São Justino, os cristãos, leigos e leigas, eram também os melhores ajudantes e aliados para a manutenção da paz no Império Romano, pois professavam doutrinas conforme o amor a Deus, ao próximo como a si mesmo, e almejavam a superação da condenação pela salvação eterna, conforme o mérito de suas ações[8].
O testemunho dos cristãos leigos e leigas
Aristides de Atenas, Padre apologista do século II afirmou que os cristãos leigos e leigas confessavam no mundo Jesus, Filho do Deus Altíssimo no Espírito Santo, descido do céu para a salvação dos seres humanos. Eles tinham os mandamentos do Senhor Jesus Cristo gravados em seus corações e os guardavam esperando a ressurreição dos mortos e a vida do século futuro. A sua atuação era importante porque se empenhavam em fazer o bem aos inimigos, não desprezavam a viúva e não entristeciam o órfão, forneciam aquele que não tinha e se eles viam um forasteiro acolhiam-no sob o seu teto, porque se chamavam irmãos segundo a alma. Estavam dispostos a dar a vida por Cristo[9].
Eles estão em comunhão com todas as pessoas
A Carta a Diogneto, escrito do século II, colocou a comunhão de vida dos leigos e das leigas com todas as outras pessoas no mundo. Eles não faziam distinções das outras pessoas, nem por sua terra, nem por língua ou por costumes. Os cristãos leigos e leigas viviam em cidades gregas e bárbaras, conforme a sorte de cada um, e adaptavam-se aos costumes do lugar quanto à roupa, ao alimento e testemunhavam um modo de vida social admirável e, sem dúvida, paradoxal. Viviam na sua pátria, mas como forasteiros; participavam de tudo como cristãos e suportavam tudo como estrangeiros. Toda pátria que não era deles era pátria deles e cada pátria era estrangeira[10].
Vede como eles se amam
A descrição dos leigos e das leigas em Tertuliano, padre do Norte da África, séculos II e III, poderia se afirmar num aspecto de amor verdadeiro às pessoas e a Deus. O afeto fraterno na qual os tornavam solícitos um com o outro, chamava a atenção dos pagãos para a exultação na qual diziam: “vejam como eles se amam entre eles” (Vide, inquint, ut invicem se diligant)[11]. Tertuliano colocou claramente o testemunho de vida dos cristãos que possibilitavam os outros a fazerem comentários bonitos porque a comunidade se queria bem e realizava obras de caridade.
Líderes eclesiais, leigos e leigas no tempo de perseguição
Eusébio de Cesaréia, bispo, século IV, afirmou na sua História Eclesiástica que na perseguição de Diocleciano no final dos séculos III e início do século IV muitos chefes das Igrejas sofreram martírio, mas também muitos leigos e leigas que deram as suas vidas pelo Senhor Jesus Cristo. Nesses combates brilharam em toda a terra os magníficos mártires de Cristo na qual testemunharam a sua coragem e amor pelo Senhor. Apresentaram em si provas evidentes do poder verdadeiramente divino e inefável de nosso Salvador. A menção deles e delas seria longa, para não dizer impossível, de modo que todos deram um testemunho de vida admirável em Cristo Jesus[12].
Nós percebemos a importância dos leigos e das leigas em nossas comunidades, paróquias e dioceses, de modo que a sua atuação merece o respeito e a dignidade. Eles e Elas estão também presentes na política, na economia, nas relações internacionais, no mundo, anunciando o Evangelho do Senhor Jesus Cristo. Nós pedimos a benção sobre todos eles e elas, para que continuem firmes na caminhada de fé, de esperança e de caridade, testemunhando o mandamento da lei de Deus, no amor a Deus, ao próximo como a si mesmo.
[1] Cfr. Documentos da CNBB, 105. Cristãos Leigos e Leigas na Igreja e na Sociedade, II,2,117. Paulinas, 2016, SP, pg. 80.
[2] Cfr. P. Siniscalco. Laico. In: Nuovo Dizionario Patristico e di Antichità Cristiane, diretto da Angealo Di Berardino, F-O. Marietti, Genova, 2007, pg. 2725.
[3] Cfr. Laico. In: Il vocabolario treccani, Il Conciso. Milano, Trento, 1998, pg. 824.
[4] Cfr. Costituzioni Apostoliche, 8,1,3-21. In: La teologia dei padri, v. 1. Città Nuova Editrice, Roma, 1981, pgs. 297-298.
[5] Cfr. Clemente aos Romanos, 46, 5-6. In: Padres Apostólicos. Paulus, São Paulo, 1995, pg. 56.
[6] Cfr. Clemente aos Romanos, 42, 1-2, pg. 53.
[7] Cfr. I Apologia 61,3. In: Justino de Roma, Paulus, São Paulo, 1995, pg. 76.
[8] Cfr. Idem, 12,1, pg. 27.
[9] Cfr. Aristides de Atenas. Apologia segundo os fragmentos gregos, 15, 1. 5-8. In: Padres Apologistas, Paulus, SP, 1995, pgs. 51-52.
[10] Cfr. Carta a Diogneto, 5, 1-6. In: Idem, pgs. 22-23.
[11] Cfr. Tertulliano, Apologetico, XXXIX, 7, a cura di A. Resta Barrile,. Oscar Mondadori, Bologna, 2005, pg. 139.
[12] Cfr. Eusébio de Cesaréia. História Eclesiástica, VIII, 3,1; 12;11. Paulus, SP, 2000, pgs. 401; 419.
20 novembro 2021
Fonte: Vatican News
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